Tuesday, December 27, 2005

Compras de Natal, Guia de sobrevivência e boa disposição.

Denotei nesta quadra que passou, um claro mau estar no seio de grande parte dos consumidores. Estes, carrancudos e tensos, moviam-se como glóbulos vermelhos no Era Uma Vez Vida, em busca do mínimo de prendas exigíveis pelos publicitários.
Como consumidor e apreciador de publicidade enganosa, faço questão de contribuir, no dia 24 de Dezembro, para as correntes humanas intermináveis do Centro Comercial Colombo, correntes essas que se desdobram pelas várias lojas como sanguessugas em busca da última gota de sangue.
Inevitavelmente, são estas pessoas, as que fazem compras à última da hora, que gastam mais dinheiro.
Porquê?
Porque nessa hora tardia já não têm paciência ou criatividade para se lançarem na senda de uma prenda original, logo, contra-balançam o défice na consciência com um défice na carteira.
Já é do conhecimento geral que esta quadra natalícia serve propósitos consumistas sob a bonita capa da fraternidade familiar e é exactamente por essa ligação adultera, entre o gasto de capital e o gosto pelas pessoas próximas, que nesta época do ano nos assolam alguns sentimentos depressivos. Penso, no entanto, que poderemos, sem grande custo, exercer pequenas acções anti-depressivas aquando da estadia em grandes superfícies comerciais. Estas acções estão parcialmente ligadas à suposta procura de uma prenda para a nossa querida avózinha e à nossa capacidade de manter uma expressão séria.
O Dr. Arranha, psicoterapeuta de renome nesta praça, a conhecida praça de São Miguel em Xabregas, tem em seu poder a fórmula que, na dosagem certa, poderá exorcizar todos os sentimentos de revolta causados pela febre consumista provocada pelo Natal.
A dosagem consiste de que entre cada demanda por uma prenda real dever-se-á proceder à procura fictícia de uma prenda que nalguns casos pode ser para a nossa avózinha ou noutros poderá dispensar a verbalização de para quem é dirigida.
Passemos então à enumeração de exemplos:
- Entrar numa loja de surf e questionar o colaborador (actual sinónimo de empregado) acerca da possível compra de uma prancha de surf para a nossa avó que, por sua vez, mede 1.47m e tem 84 anos. A mesma questão poderá ser posta, de igual modo, nas secções de bikini’s, tábuas de skate e gorros, pois produzirá o efeito desejado.
- Entrar numa loja de lingerie e remexer em cuecas “fio-dental ou asa-delta” até chamar a atenção da colaboradora (©). Quando formos confrontados com a pergunta "Quer ajuda?", devemos referir que estamos à procura de algo para a nossa avó. Esta afirmação deve ser precedida por um “encaminhar” do nosso pensamento para questões depressivas como a actual época do Sporting, de forma a preservarmos a nossa “poker face”.
- Entrar na loja Funny, agarrar num item relativo à temática de pénis artificiais e afins, começar a ler o verso da embalagem e após alcançada a atenção da ©, repetir a conduta referida anteriormente em relação à lingerie.
- Ir à loja Fubu e inquirir sobre a existência de uma linha hip-hop para idosos.
- Ir à loja do Urso (Natura, se não me engano) e inquirir sobre quanto custa o imponente urso.
- Ir a lojas de artigos dispendiosos, Façonnable, Peter Hadley, etc... e perguntar pelo preço de um qualquer artigo para após o embate gerado pelo elevado número de dígitos relativos ao preço do mesmo artigo, exclamar e inquirir: “Xiiiiiiiiiiiii pá! Isso é muita caro ó meu! E que atençãozinha é que faz?”. Devo referir, a título excepcional, que a expressão “Dar uma atençãozinha” é até à data, a que melhor descreve o verdadeiro português. Somos a nação das “atençõezinhas”.
- Ir à Fnac ou à Worten, desarrumar diferentes iténs como Cd’s, DVD’s, livros, etc. Simples, mas extremamente eficaz no combate ao sentimento de culpa causado pela cedência ao consumismo. Aliás, tenho a certeza de que este sentimento de culpa é o cerne desse inexplicável comportamento feminino que é o acto de desarrumar tudo o que podem numa loja de roupa. Nós, os homens, sentimo-nos obrigados a experimentar praticamente todos os itens que desarrumamos, logo, praticamos essa desarrumação com cautela e contenção, enquanto ao invés, as mulheres chegam lá e é o desatino total. Daí que os furacões sejam denominados no feminino ou seja, Rita, Katrina ou ainda a minha preferida, a imponente Hilda Furacão.

Espero agora pelo contributo do leitor (através de exemplos) para a maximização desta prodigiosa técnica anti-depressiva desenvolvida pelo Prof. Dr. Arranha para consumidores revoltados.

P.S. A denominação feminina dada a furacões fez-me pensar no porquê de se usar o feminino nesta temática. Se é errado dizermos o advogado Vanessa ou o dentista Albertina, também me parece errado referir um substantivo no masculino seguido de um nome no feminino, algo que acontece na denominação do furacões. Deste modo e sendo a favor de que esta temática preserve a sua feminilidade, penso talvez fosse adequada a mudança para o feminino do substantivo furacão, perfazendo desse modo a expressão “a Fura.... Katrina”. Por outro lado, talvez seja melhor deixar como está...

Wednesday, December 21, 2005

As meninas não podem gostar (publicamente) de sexo

Esta afirmação resulta de um demorado estudo que o Arranha levou a cabo ao questionar várias meninas, senhoras, estas maduras ou idosas, sobre o acto sexual. O inquérito consistia na simples e solitária questão, “Gosta de fazer sexo?”.
A pergunta referida teve como feedback as mais variadas reacções, entre elas sorrisos, agressões, descomposturas, etc... mas nunca um simples sim.
Como é do conhecimento público, a única mulher que comprovou cientificamente não gostar de sexo é a ex-ocupante do 10, Downing Street, Margaret Thatcher.
Ora se a questão não foi posta a este bastião da frigidez, porque será que as inquiridas nunca se sentiram à vontade para demonstrar a sua estreita relação com a actividade sexual?
Porque não podem.
E porque é que não podem?
Porque a maioria das mulheres como seres sensíveis que o estereótipo nos diz serem, não podem afirmar publicamente que lhes apraz bastante a ocasional sessão de “trungalhunguice”.
Ao invés, penso que todos estaremos de acordo acerca da réplica dada por membros do sexo masculino à mesma pergunta.
“Sim!!” Diriam em plenos pulmões...
“Quanto mais, melhor!” Diriam os mais necessitados...
Assim sendo, qual será a origem da abissal diferença de atitude na afirmação pública do gosto pelo sexo?
Até podia entrar na velha discussão social do porquê de se chamar engatatão ou garanhão (ou qualquer outro animalónimo comprovativo de masculinidade) a um homem que tem muitas mulheres e puta se acontecer o oposto, no entanto, esta discussão parece-me mais ligada ao compromisso do que à questão sexual em si mesma.
Ora, em relação à questão sexual, continuamos a perpetuar, especialmente no nosso país, que a mulher não pode demonstrar publicamente o desfrute do acto sexual.
Passemos então a um exemplo que penso explanar bem a questão da afirmação pública do gosto pelo sexo.
Imaginemos que um casal de namorados, composto por Aníbal Cavaque Silva e Manuela Legre (nomes fictícios), estava a passar o Natal numa pousada em Venda da Gaita. Agora imaginemos que sem estes saberem, todas as suas actividades conjugais tinham sido filmadas por uma câmara escondida. Recorrendo mais uma vez ao instrumento da imaginação, fabriquemos a pseudo-realidade de que essa mesma película era divulgada e de que nela estavam contidas cenas em que a Manuela se demonstrava extremamente apta para o desfrute do coito. Decerto que seria classificada com o adjectivo “ordinária” pela maior parte das pessoas, já Aníbal sairia incólume. Aliás, em regra geral, qualquer rapariga que seja filmada durante o acto sexual está sujeita a ser vista como ordinária, a não ser que a sua interpretação se paute por um ar de cadáver a ser autopsiado.
É opinião do Arranha que esta é uma gritante injustiça social, sem dúvida retrógrada nestes tempos de cultura democrática (expressão muito em voga). Como resultado disso devo referir que, como cidadão, sinto um obeso pesar por este estado de coisas.
Dito isto, sou completamente a favor do correcto e fervoroso desfrutar do acto sexual por parte da mulher e devo-vos dizer que o Arranha já tem provas dadas nesse campo. (Que aldrabista!)
Indo mais além, não tenham dúvidas caros leitores, que até as nossas avózinhas, entre o seu tricot e a feitoria dos seus suculentos Vauls aux Vents, desfrutaram de belas sessões de “trungalhunguice” com os nossos avôs.
Esta é uma imagem que não é bem-vinda, eu sei.... mas penso que seria ao aceitar esta realidade que estaríamos a receber a mais importante lição de educação sexual e esta consiste, a meu ver, que cabe a cada um saber o que é normal para si e de que tudo é normal desde que seja praticado de comum acordo.
Esta temática transporta-me para a importante questão da educação sexual e devo dizer que em relação a este assunto possuo uma resposta rápida e eficiente para todos os problemas que assolam o desabrochar sexual dos petizes. Uma proposta vanguardista que me parece que nem os holandeses estão preparados para a sua implementação.
Na óptica do Arranha, a educação sexual deveria consistir num vídeo dos progenitores a praticarem o desporto rei.
Chocados?
A fundamentação desta medida consiste na necessária desmistificação do acto sexual. E para isso deve-se filmar não um acto ensaiado, em que os participantes estejam reprimidos mas sim uma bela sessão de ruff stuff paternal. No entanto, o liberalismo do Arranha tem limites e assim sendo, não haveria cá grandes planos de coisas que não vale a pena a ver. Este filme serviria apenas o propósito de nos libertar de grande parte das pré-concepções acerca de como deve ser a nossa conduta ou a do parceiro/ra. Concluíndo, cada pessoa tem o seu à vontade e a sua linguagem sexual. (Momento Júlio Machado Vaz)
Penso que é exactamente devido a estas pré-concepções que as “meninas” têm receio de afirmar publicamente o gosto pela prática do sexo, logo, há que emancipar também este aspecto na mulher, até porque esta seria uma emancipação amplamente apoiada pelos elementos do sexo masculino, onde eu próprio me incluo.

Sunday, December 11, 2005

O cumprimento (parte III)

Tal como na mais importante triologia do cinema, O Padrinho, também neste assunto o Arranha decidiu que seria melhor dar algum tempo de pausa antes de abordar o derradeiro capítulo desta saga.
A última e mais dura reflexão sobre a temática do cumprimento debruça-se sobre as mais importantes questões funcionais e relacionais do mesmo.
Dada a complexidade intrínseca a esta temática, penso que a melhor maneira de "arrumar" esta matéria será através da enumeração de diferentes situações. Como é óbvio, não serão abordadas todas as possibilidades, mas os princípios que regem as situações referidas poderão ser transpostos para as outras situações cujas premissas relacionais se revelem semelhantes.
1ª situação – Entrada na discoteca
Em situações onde as nossas divagações nocturnas nos levem a estabelecimentos em que não somos vistos como clientes da casa, nunca deveremos proferir a expressão “Boa Noite” antes do porteiro, pois ela irá ressoar na sua mente primária como a custosa, para nós, expressão “Quanto é?”.
Nos estabelecimentos onde já somos tidos como clientes da casa, nunca, mas nunca, devemos ser nós a estender a mão primeiro de forma a executar o precioso cumprimento. Porquê? Porque desta forma não faremos aquela triste figura de pessoa que anseia demonstrar conhecer o porteiro. Aliás, o porteiro deve ser tratado com a maior discrição possível, ou seja, um cumprimento meramente cordial e ausente de qualquer efusividade.
2ª situação – Estranho à distância de amigo
Quando estamos em plena confraternização com um amigo/a e alguém se acerca de nós de forma a falar com ele/a, não se apresentando a nós, ficamos na delicada situação de ter duas pessoas a falar imediatamente ao lado mas cuja conversa não nos diz rigorosamente nada. Nestas alturas e no caso do sujeito/a não proceder ao cumprimento aquando da abordagem inicial, o amigo/a deve fazer as apresentações. No caso de não acontecer qualquer atitude amistosa por parte do estranho ou qualquer tipologia de apresentação por parte do amigo, não devemos ceder à tentação de ficar desconfortáveis com a situação, ou seja, se o intruso/a desprezou a nossa presença, deveremos retorquir-lhe pelo mesmo tratamento. De qualquer forma, nunca deverá partir de nós o acto do cumprimento nestas situações.
3ª situação – Grupos Grandes
Estas situações são das mais embaraçosas e ao mesmo tempo das mais simples de resolver. Nunca, em casos de grupos com mais de 5 pessoas, se deve executar qualquer tipo de cumprimento a não ser o aceno geral. Esta conduta poupar-nos-á a uma extensa “beijoquice” e “bacalhauzice” (não há nada mais ridículo do que aquelas longas sequências de trocas de beijos numa festa numerosa, pior ainda quando são dois a cada pessoa), algo que nos deixa de imediato completamente retraídos. No entanto, pode haver sempre um/uma Empata-Aceno que mal nos vê vem-nos cumprimentar com uma grande pompa e circunstância. É óbvio que após se cumprimentar um, tem de se cumprimentar todos, mas não nos devemos esquecer dessa mesma pessoa e, assim que possível, procurar "acidentalmente" entornar sobre ele/a algo de forma a puni-lo sobre a penosa beijoquice a que nos impôs.
4ª situação – Cumprimentar ou não cumprimentar, eis a questão
O mundo está divido em conhecidos, desconhecidos e a pior espécie de todas, os ex-conhecidos. Há muitas pessoas que, pelas incidências da vida, vamos conhecendo para depois desconhecer e às vezes voltar a conhecer. Essas são, a meu ver, as pessoas que deveriam desaparecer da “nossa” face do planeta.
Estas situações são extremamente frágeis, pois a linha entre uma pessoa simpática e uma pessoa antipática é muito ténue. É curioso como muitas vezes passamos por pessoas que conhecemos e que nos conhecem a nós e, no entanto, ninguém se fala. Penso que este desprezo, se for recíproco, é salutar pois não temos de andar aos beijinhos e aos “bacalhaus” a toda a gente que por certas e determinadas circunstâncias da vida nos cruzámos no passado. A quantidade de conversa da treta que é poupada através desta conduta será fundamental para a nossa futura existência. Aliás, penso que devo ter gasto bastante da mesma quando era mais novo pois hoje em dia, sinto que me restam poucos créditos para gastar. Penso também em relação a esta situação que a pessoa só deve abordar por gosto e não por obrigação, pois valorizo bastante mais as inimizades do que as falsas amizades.
5ª e última situação – A relação amorosa
Nunca se deve, ao cruzar com uma pessoa que conheçamos mal, perguntar de imediato sobre o namorado/a dessa mesma pessoa, a não ser por uma razão que mais à frente abordarei. Regularmente são usadas expressões como “Olá! Então e o Joaquim, tá porreiro?” ou “Então pá! Como é que está a Vanessa?”, a que muitas vezes se segue um “Não sei.” ou um “Tudo bem.” com um ar triste ou ainda, mais directamente, um “Já não ando com ele/a.”. Nestas alturas, o inquisidor/ra fica enrascado com a escolha entre procurar saber mais sobre o que se passou, através da pergunta “Então, o que é que se passou?” ou terminar friamente com um “Olha, são vidas...”. No entanto, o questionar sobre a vida amorosa pode, por outro lado, ter um carácter informativo bastante positivo na eventualidade de uma possível aproximação entre o/a remetente da pergunta e o/a receptor/ra da mesma. Desta forma, há que proceder a uma cuidada ponderação antes de usar esta técnica.
Está pois dada a visão do Arranha sobre este pequeno segmento do maravilhoso mundo social.

Saturday, December 10, 2005

Diário do Arranha, Conduta do sujeito e intermitências no sono após noite de alcoolismo

6h 05m – Entrada em casa
6h 06m – Primeira tentativa de ligação da luz do WC.
6h 07m – Segunda tentativa de ligação da luz do WC
6h 08m – Ligação da luz do WC!
6h 09m – Início do desapertar da braguilha
6h 13m – A postos para a prática da necessidade fisiológica nº1!
6h 18m – "Ahhhhhhhhhhhh!" Seguido de uma lavagem rápida e duvidosa das mãos.
6h 20m – SMS à Arranhiça a dizer que o amor por ela continua a fluir nas veias do Arranha.
6h 21m – Descalçar dos sapatos e deambulação aleatória pelo quarto à procura de algo que depois não se lembra do que se trata.
6h 24m – Transformação do Pequeno Arranha em Predador Alimentar Alcoolizado (PAA)
6h 27m – PAA entra na cozinha
6h 28m - PAA debruça-se sobre umas bolachas Oreo, enquanto faz zapping.
6h 29m – O PAA fica estupefacto, qual o homem das cavernas, sobre um anúncio da GigaShopping no qual um micro-ondas também funciona como ferro de engomar.
6h 30m – PAA termina pacote de bolachas, deixando um rasto de migalhas entre o pacote e a área de consumo.
6h 31m – PAA não satisfeito, descobre um recipiente com um resto de feijoada à brasileira manufacturada na passada 4ª-Feira e pensa: “Se comer isto vou ficar mal disposto”. A este pensamento segue-se um inevitável “Que se lixe!”
6h 38m – PAA acaba a feijoada à brasileira
6h 39m – Quando o PAA se dirige para apagar a luz da cozinha, vislumbra um pacote de pevides tostadas e conclui que era exactamente este o complemento que faltava para tapar aquele “buraquinho” que permanece no estômago.
6h 41m – PAA termina pacote, pensando: “Porra, já estou um bocado mal disposto.” Sai da cozinha, com algum peso na sua consciência nutricionista.
6h 42m – Transformação de PAA em Pequeno Arranha.
6h 43m – Entra no seu chambre, veste o pijama e deita-se.
6h 44m – O doloroso paladar, derivado da mistura de álcool com feijoada, pevides e bolachas Oreo, funciona como impulsionador a uma vontade inadiável de o Arranha se levantar e levar a cabo a previamente esquecida tarefa de lavar o seu sistema dentário.
6h 49m – Volta para cama e finalmente adormece.
7h 35m – “Ataque cardíaco” com o despertador do telemóvel, que, durante os chamados dias úteis, está marcado para esta hora.
9h 12m – O sono do Arranha é interrompido por uma inolvidável vontade de beber água.
9h 13m – Defronte do frigorífico, abre-o, retira a garrafa e bebe desenfreadamente directamente do gargálo.
9h 14m – "Ahhhhhhhhhh!"
9h 15m – Após saciado da sede que apoquentava o sono do Arranha, este pôde recolher aos lençóis com a certeza de que no restante tempo de dormência não viria a ser incomodado.
9h 26m – Começam a martelar na casa do lado.

Thursday, December 01, 2005

Paris

Este é o nome dessa aprazível metrópole que, no próximo fim-de-semana, terá o prazer albergar o petiz de nome Arranha. Porquê Paris?
Por duas razões.
A primeira, prende-se com a sua beleza, vida, luz e outras paneleirices a sete.
A segunda, devido a ser, actualmente, um local de eleição para o correcto e sustentado desabrochar de pirómanos, característica essa que, no passado, o Arranha omitiu ao leitor.
Mais do que um pirómano, o Arranha define-se a si próprio como um inquestionável patriota e ambientalista.
Como já todos sabemos, a capital francesa tem sido assolada por uma torrente de automóveis incendiados, no entanto, parece-me que os verdadeiros motivos que geraram este “problema” ainda não foram abordados.
O primeiro tem a ver com ambiente.
É opinião do Arranha, de que a já famosa “queimada” de automóveis em Paris (moda que irá concerteza singrar, tal como as largadas de touros em Pamplona) se deve a uma mega-operação relacionada com o ambiente e com o ordenamento do território. Como é do conhecimento geral, os automóveis têm uma acção nefasta para o meio ambiente, logo, a inflamação dos mesmos será uma boa notícia do ponto de vista ambiental. Em relação ao ordenamento do território, tal como ouvimos enúmeras vezes em debates para as eleições autárquicas, o excesso de automóveis é um factor definidor do declínio da qualidade de vida nas cidades. Aliás, o que o leitor não sabe é que a política de diminuir, para metade, o nº de automóveis em Lisboa, equacionada por Manuel Maria Carrilho, englobava uma chamarela de automóveis em pleno Terreiro do Paço na passagem de ano. Desta forma, diminuía-se o nº de automóveis na cidade de Lisboa e poupava-se o dinheiro em pirotécnia.
Bem, voltando aos incidentes na cidade de Paris, fiquei extremamente triste por perceber que os nossos emigrantes não estão a dar uma boa imagem dos pirómanos portugueses. Actividade essa que, no nosso belo país, tem muita gente capaz. Aliás, não tenho dúvidas de que a imagem de Portugal melhoraria se exportássemos os nossos grandes pirómanos, tal como o fazemos em relação aos nossos grandes investigadores.
Como ninguém se ofereceu para exportar esse pequeno pirómano, de nome Arranha, terá de ser o próprio, do seu bolso, a pagar o custo de levar avante a patriótica tarefa de defender o bom nome dos pirómanos portugueses no acontecimento mais mediático da pirómania mundial, o festival Flambé Paris 2005.
Pensando agora num contexto mais social, há outro factor com o qual o Arranha se sentiu melindrado e que pensa servir de explicação para a sua ida a Paris. Este factor envolve a utilização do termo escumalha, por Nicolas Sarkozy (um abraço para ele), relativamente aos habitantes dos subúrbios. Sendo o Arranha, um habitante desse belo subúrbio modernista, a Portela, ficou, como o leitor decerto compreenderá, bastante sentido com as palavras do ministro. Além disso, também o Arranha já sentiu na pele o que é ser alvo de discriminação social.
Porquê?
1) Porque sendo um português de 10ª geração, o Arranha ainda não é tratado, pelos meus pares, como um português de 11ª ou 12ª geração, algo que afecta claramente a sua inclusão social.
2) Porque o Estado não ajuda os discriminados. Presentemente, o discriminado Arranha tem o esquentador a aquecer pouco a água e o Estado, sarcasticamente dentro de toda a sua esfera de poder, não se lembra de mandar um técnico especializado para o arranjar ou, caso este não o consiga, mandar alguém para aquecer a água na chaleira. Ou seja, lá tem de ser o pobre coitado do discriminado a fazê-lo.
3) Porque o Estado não providencia ao discriminado, o petit Arranha, a tão ambicionada habitação social, um mero T3 na Estrela, com vista para o rio. E finalmente...
4) Porque os fósforos com que o Arranha promoverá o bom nome de Portugal além fronteiras não são comparticipados pelo Estado.

Aqui fica a fundamentação para a minha deslocação a Paris, com a promessa de na volta redigir uma crónica em francês (14ª língua do Arranha).